quinta-feira, 21 de abril de 2011

Últimos dias na Tailândia

Aqui publico um email que escrevi para alguns familiares e amigos ao fim da minha viagem a Tailândia, falando do que vi e um pouco do que aprendi.
--------------------------------------------------------------------

Chego ao fim desta minha viagem, hoje é o último dia de Tailândia desta vez.

Amanha já passarei o dia nos aeroportos da vida. De Chiang Mai vôo pra Bangkok, dai pra Mumbai, dai pra Londres, de lá pego ônibus pra Cambridge e daí pego um taxi pra casa! Iupiiiii!!!!

Já sinto que está na hora de ir pra casa. Depois de tanto trabalho duro, senti cansaço e saudade de casa que nunca ficou de lado completamente.

Saio daqui com meu coração transbordando de alegria, de aprendizado, de bagagem acumulada e de boas recordações.

Nossa, tenho tanta coisa boa pra contar, vi tanta coisa ótima e tanta coisa que precisaria ser mudada no mundo, aprendi muito e volto ainda mais determinada a seguir firme na busca por um mundo melhor pra todos: homens e animais.

A fundadora da ONG dos elefantes se chama Lek e não posso pensar nela que tenho vontade de chorar de emoção literalmente. Ela é pequena de tamanho como o apelido “Lek” já diz, significa “pequeno” em
tailandês, mas é infinita na bondade!

Ela nos mostrou um vídeo sobre elefantes e sua situação na Tailândia e conversou com meu grupo por uma hora mais ou menos. Eu nem pisquei nas palavras dela, pois são contagiantes. Eu queria muito chorar enquanto a ouvia, mas não chorei, pois não pararia.

Sabe quando a pessoa te emociona por ser tão boa de coração? Ela é assim, contagia todo mundo sem fazer nada de especial.

Ela entrou na sala de vídeo e 4 cães a seguiram, dois subiram em cadeiras, se ajeitaram e dormiram – foi muito engraçado! Os outros dois se espalharam pelo chão mesmo. Onde ela vai, eles vão junto! Hehe

Eu não chorei na hora como lhes contei, mas depois de 6 semanas tendo boas risadas, sinto que preciso chorar de felicidade também!

Não sei o que mais me fez feliz aqui...se os bons amigos que fiz - topei com tanta gente jóia e as que não eram jóia acho que não ficaram perto de mim, graças a Deus. Pessoas que vão deixar saudade e bons momentos marcados.

Se foi fazer parte de bons atos, de ajudar gente que só quer fazer o bem, como no projeto dos gibões ou no dos elefantes...  

Se foi conhecer mais da cultura do budismo, viver num mundo leve e sorridente, gentil e honesto. Outra vez a sorte esteve comigo: todo troco a mais que dei foi devolvido, tudo que quis fazer deu certo, se não fiquei no melhor quarto na ONG dos elefantes, achando que seria má sorte...estava enganada de novo: fiquei na casa de bambu, com frestas por todo lado, chão que balançava ao pisar, mas era o único lugar com chuveiro quente! =)

Eu sei que nada é perfeito, mas o mundo me sorri por aqui. Talvez porque eu sorrio pro mundo, talvez por que sou sortuda, talvez por que Deus gosta de mim e me reserva uma vida cheia de bons desafios ainda...ou talvez porque eu escolho ver o mundo colorido.

Nem sempre vejo a cor do mundo, muitas vezes é a realidade dura que está em todo lugar que vejo, mas bons momentos como estas 6 semanas que chegam ao fim, me dão força pra continuar firme e forte!

Tem gente que fala que eu não tenho senso de humor...coisa que vem desde minha época de cursinho – tempo de estresse e desafio – acho que não tinha senso de humor mesmo aquela época! Hahaha

Mas aqui as pessoas me falam que vão sentir falta das minhas risadas e dos meus momentos engraçados. Escutei tanta palavra linda, ganhei presentes de despedida de pessoas que nem falavam inglês.

Ser útil é ser feliz! E nada melhor que estar rodeada de animal por todos os lados. Eles são anjos peludos ou com pele grossa ou cobertos de penas, mas estão aqui pra dar graça ao planeta!

Em trabalhos voluntários o negócio é vir com o coração aberto e pronto pra receber os desafios, que são muitos e constantes! Mas o resultado vale a pena. Mais amigos espalhados pelo mundo, mais conhecimento de culturas e povos e a sensação de ter contribuído.

No final da semana na ONG dos elefantes eu senti o cansaço das quase 6 semanas longe de casa. Minhas mãos tinham calos, estavam grossas, minhas roupas sujas, meu cabelo seco feito palha (exagero! haha), minha perna cheia de roxo...meu corpo precisava de folga, mas minha mente estava feliz! =)

Depois da mensagem da Lek, que contarei a vocês em detalhes outro dia, o que fica desta ultima semana é a mensagem dos elefantes.

Todos os que estão no parque foram resgatados do trabalho do corte ilegal de árvores e das agências de trilha de elefantes – acho que o maior turismo tailandês é fazer trilha nas costas dos elefantes, andar pelo mato, pelos rios nas costas deles e etc.. (o que acontece na Índia, Miamar, Laos, etc)

Bem rápido só pra explicar de leve: pra um elefante ser domesticado, ele sofre muito quando pequeno. O treinamento tradicional é brutal – amarram o animal por semanas em cercados do tamanho exato do seu corpo, batem neles sem parar, geralmente uns 5 a 15 homens pra dar conta. Depois da tortura soltam o animal da jaula, mas mantêm eles em correntes...mais tortura...e no final de tudo, o cerne do elefante se perdeu na violência.

É comum e corriqueiro eles serem cegos de um olho pelo menos pra facilitar o treinamento.

O mahout, que é o homem que vive com o elefante a vida toda, pode ser gentil ou não, e no caso da maioria, eles usam ganchos que machucam pra fazer o animal obedecer...

Não é lenda, o mais comum de tudo é ver elefantes serem guiados por mahouts com um cajado e gancho na ponta.

Depois de anos assim os elefantes ainda nos amam e são gentis. Vivem conosco, trabalham pra nós e nos perdoam.

Há elefantes cegos na ONG, há elefantes com meio pé, pois o resto explodiu na mina que ele trabalhava, há elefante com o quadril todo torto, pois quebraram seus ossos e ainda o punham pra carregar madeira.

Há elefantes que viram seus filhos morrerem na sua frente, pois não podiam parar de trabalhar pra alimentar o bebe... e há órfãos que viram suas maes morrerem de tanto trabalhar...

Elefantes são como a gente, tem um forte laço social, ficam de luto pelos que morrem, são inteligentes e perdoam como ninguém.

Eles são gigantes gentis. Com toneladas de peso que podiam me esmagar num segundo, eles me tocavam com a tromba, me olhavam com olhos cheios de pensamentos, aceitavam a minha curiosidade e o meu medo de ser esmagada...

Eles se deixam comandar...

Eles jamais esquecerão que seres humanos foram os responsáveis pelas suas torturas, mas sabem perdoar e aceitam os que não os causam dano.

Como dizem: elefantes jamais esquecem...e adiciono mais duas palavras: elefantes jamais esquecem,  mas perdoam!

Um dia conto pra vocês tudo que aprendi deles nesta semana. Um dia pedi pra ficar o dia todo com um mahout e aceitaram. Acordei as 6 da manha e segui o Tony, um mahout da Bélgica que está cuidando da Jarunee por 3 meses e treinando um dos elefantes bebe do parque.

Ele não usa violência como vocês podem imaginar, ele usa a mesma técnica de reforço positivo que aprendi na ONG em Munique. Ele nem toca na elefantinha, mas ela já sabe erguer o pé, ir pra frente e pra trás, dar a tromba etc. Tudo pelas bananas que recebe! Hehehe

Elefante aqui é como cão, se pode ter em casa, se pode comprar e vender...e a única forma de se conviver com eles é educando. Uma vez que já não há quase floresta pra que eles vivam soltos, o jeito é ter certa educação e um mahout que lhes ama de verdade.

A Jarunee foi cega de um olho quando trabalha com turismo se não me engano, daí no parque mesmo o antigo mahout não cuidou do olho bom que não era tão bom assim e então ela ficou cega de vez. O mahout foi despedido e agora o Tony está com ela.

Os mahouts do parque são birmaneses resgatados do campo de refugiados. A Lek os busca e lhes dá nova chance de vida. Muitos, como este ex mahout da Jarunee, não entendem o treinamento de não violência ou de amor, o que continua sendo um desafio pra Lek mesmo em seu parque.

Lá ninguém bate nos animais, muito menos usam cajados ou ganchos...mas ela espera mais, mais cuidado, como o de evitar que um elefante perca a visão do olho por desleixo.

Só pra constar, tem um mahout que todo dia dá uma flor pro seu elefante no parque! Tenho até foto pra mostrar. =)

Eu fiquei com a Jarunee por um dia, como ela é cega era ainda mais perigoso, pois ela poderia me esmagar sem me ver que estava em cima de mim.

Só sei que meus olhos se encheram de lágrimas ao passar pelo recinto dela no último dia...eu já sabia que fruta que ela gostava, já me via colhendo figo no pé e procurando o Tony no campo pra dar as frutinhas pra ela.

Eles são assim: super fáceis de amar e difíceis de largar!

Depois de viver entre 70 cães soltos, gatos por todo lado, urso, cavalo, búfalos e elefantes...voltar pra cidade fica meio sem graça, mas é assim que deve ser por enquanto.

Levo tanta coisa maravilhosa desta viagem e um coração tão cheio de felicidade que só posso agradecer à
Deus sem parar e à todas as pessoas e coisas que me fizeram estar aqui agora...meus pais, minha família, meu marido que me apóia em tudo e mais um pouco, meus amigos, meus cães que me mantém saudável  e com a mente limpa, todos os outros exemplos de gente que fazem a vida dos outros e dos animais melhor, que foram ou sao minha inspiração...tudo aquilo que não vejo, mas sinto, o que não compreendo direito, mas aceito...

A tudo e todos, o meu muito obrigado!

2 comentários:

  1. Que lindo Laura!!! To arrepiada! E com os olhos cheios d'água!
    Que experiência maravilhosa! Faz bem pra alma! E para esses animais maravilhosos!
    São pessoas como você que fazem desse nosso mundo maluco um lugar melhor pra se viver!
    Parabéns!

    ResponderExcluir
  2. Laurinha, que lição de vida heim!
    Chorei e choro em pensar no sofrimento dos elefantes, não sei se teria o mesmo equilíbrio que você, talvez se conhecesse um desses treinadores maus, acabaria com ele!

    ResponderExcluir